CURSO DE REDAÇÃO – ROTEIRO Nº 5
1 – TEMA: Os defeitos de um texto: ambigüidade, obscuridade, cacofonia, eco, prolixidade.
2 – PRERREQUISITO: Gostar de ler.
3 – META: As atividades deste Roteiro tem o objetivo de:
a) identificar os defeitos mais comuns que ocorrem numa redação
b) permitir ao estudante o treino de redação sem os defeitos estudados
4 – ATIVIDADES DE ESTUDO:
a) Leia os textos A e B. Faça os exercícios, depois que tiver certeza que entendeu bem as explicações dadas.
b) Por fim, faça uma última leitura e reveja todos os exercícios com o objetivo de fixar os conceitos estudados.
c) Se encontrar dificuldade, procure um professor de português ou um amigo que possa ajudá-lo a esclarecer as Duvidas surgidas no decorrer do estudo.
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ANEXO A – Texto para reflexão
O GIGOLÔ DAS PALAVRAS
(Luis Fernando Veríssimo)
Quatro ou cinco grupos de alunos do Farroupilha estiveram lá em casa numa missão designada por seu professor de Português: saber se eu considerava o estudo da Gramática indispensável para aprender e usar nossa ou qualquer língua. Cada grupo portava seu gravador cassete, certamente o instrumento vital da pedagogia moderna, e andava arrecadando opiniões. Suspeitei, de saída, que o tal professor lia esta coluna, se descabelava diariamente com as suas afrontas às leis da língua, e aproveitava aquela oportunidade para me desmascarar. Já estava até preparando, às pressas, minha defesa (“Culpa da revisão! Culpa da revisão!”). Mas os alunos desfizeram o equívoco antes que ele se criasse. Eles mesmos tinham escolhido os nomes a serem entrevistados. Vocês têm certeza que não pegaram o Veríssimo errado? Não. Então vamos em frente.
Respondi que a linguagem, qualquer linguagem, é um meio de comunicação e que deve ser julgada exclusivamente como tal. Respeitadas algumas regras básicas da Gramática, para evitar os vexames mais gritantes, as outras são dispensáveis. A sintaxe é uma questão de uso, não de princípios. Escrever bem é escrever claro, não necessariamente certo. Por exemplo: dizer “escrever claro” não é certo mas é claro, certo? O importante é comunicar. (E quando possível surpreender, iluminar, divertir, comover… Mas aí entramos na área do talento, que também não tem nada a ver com a Gramática). A Gramática é o esqueleto da língua. Só predomina nas línguas mortas, e aí é de interesse restrito a necrólogos e professores de Latim, gente em geral pouco comunicativa. Aquela sombria gravidade que a gente nota nas fotografias em grupo dos membros da Academia Brasileira de Letras é de reprovação pelo Português ainda estar vivo. Eles só estão esperando, fardados, que o Português morra para poderem carregar o caixão e escrever sua autópsia definitiva. É o esqueleto que nos traz de pé, certo, mas ele não informa nada, assim como a Gramática é a estrutura da língua que sozinha não diz nada, não tem futuro. As múmias conversam entre si em Gramática pura.
Claro que eu não disse tudo isso para meus entrevistadores. E adverti que minha implicância com a Gramática na certa se devia à minha pouca intimidade com ela. Sempre fui péssimo em Português. Mas – isto eu disse – vejam vocês, a intimidade com a Gramática é tão dispensável que eu ganho a vida escrevendo, apesar da minha total inocência na matéria. Sou um gigolô das palavras. Vivo às suas custas. E tenho com elas a exemplar conduta de um cáften profissional. Abuso delas. Só uso as que eu conheço, as desconhecidas são perigosas e potencialmente traiçoeiras. Exijo submissão. Não raro, peço delas flexões inomináveis para satisfazer um gosto passageiro. Maltrato-as, sem dúvida. E jamais me deixo dominar por elas. As palavras, afinal, vivem na boca do povo. São faladíssimas. Algumas são de baixíssimo calão. Não merecem o mínimo respeito.
Um escritor que passasse a respeitar a intimidade gramatical das suas palavras seria tão ineficiente quanto um gigolô que se apaixonasse pelo seu plantel. Acabaria tratando-as com a deferência de um namorado ou com a tediosa formalidade de um marido. A palavra seria a sua patroa! Com que cuidados, com que temores e obséquios ele consentiria em sair com elas em público, alvo da impiedosa atenção de lexicógrafos, etimologistas e colegas. Acabaria impotente, incapaz de uma conjunção. A Gramática precisa apanhar todos os dias para saber quem é que manda.
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ANEXO B – OS DEFEITOS DE UM TEXTO
O texto que acabamos de ler traduz a opinião do escritor Luis Fernando Veríssimo e sugere qual deve ser a nossa postura diante da língua portuguesa: a de que devemos dominá-la para nos comunicar com outros falantes da língua sem, contudo, nos afastarmos do objetivo principal: a clareza da comunicação.
Por isso, ao escrevermos devemos evitar defeitos que podem prejudicar a compreensão daquilo que escrevemos.
Vamos tratar, neste Roteiro, dos principais defeitos para os quais devemos estar atentos e não cometê-los.
1. AMBIGUIDADE
O dicionário define o que é ambigüidade: mais de um sentido, incerteza, hesitação, equívoco. Uma frase escrita apresentará ambigüidade quando der condições para ser interpretada de várias maneiras, isto é, apresentar vários sentidos. Isto ocorre, geralmente, quando houve mau emprego da pontuação, de palavras e/ou expressões. Veja o exemplo:
O médico examinou o cliente preocupado. (quem estava preocupado: o médico ou o cliente?)
Aqui, a falta de uma vírgula ou a má localização de uma palavra na frase, gerou essa dúvida. A melhor construção da frase seria:
- O médico preocupado, examinou o cliente.
- O médico examinou o cliente, preocupado.
- Preocupado, o médico examinou o cliente.
- O médico que estava preocupado, examinou o cliente.
Ao usarmos uma vírgula e aproximarmos a palavra “preocupado” da palavra “médico”, evitamos que dois sentidos possam ser interpretados nesta frase. Naturalmente, se a idéia a ser comunicada é a do médico preocupado com o cliente.
A virgula é mais do que um simples elemento de pontuação. Enquanto os demais sinais têm uma função definida, a virgula influi diretamente no sentido do que está expresso. Assim sendo, ela é um elemento de leitura.
Um importante conselho para o treino da habilidade de redigir é prestar atenção nas vírgulas e tomar decisões corretas ao seu emprego. Sempre é bom consultar um manual sobre o emprego da virgula, mas como Veríssimo diz, “o importante é comunicar” e não nos deixarmos escravizar pelo “esqueleto” da língua: a gramática.
Vamos exercitar.
As frases abaixo apresentam ambigüidade. Explique qual a ambigüidade existente e reescreva-as de modo que fiquem claras, sem dupla interpretação.
a) Peguei o ônibus correndo.
b) O guarda deteve o suspeito em sua casa.
c) O menino viu o incêndio do prédio.
d) Michele telefonou para Rodrigo e avisou-lhe que sua amiga ia chegar naquela semana.
GABARITO
a) Quem estava correndo? Eu ou o ônibus?
1a. opção: Eu corri para pegar o ônibus.
2a. opção: O ônibus corria quando o peguei.
b) Em qual casa o suspeito foi detido? Na casa do guarda ou na casa do suspeito?
1a. opção: Quando o guarda chegou à casa do suspeito, deteve-o.
2a. opção: O suspeito foi detido na casa do próprio guarda.
c) Neste exemplo há três interpretações:
- O menino estava em algum lugar e de lá viu o prédio pegando fogo.
- O menino estava no prédio e desse prédio viu um incêndio.
- O menino estava no prédio que pegou fogo e presenciou o fato.
1a. opção de redação: O menino viu o prédio incendiar-se.
2a. opção de redação: Do prédio, o menino viu o incêndio.
3a. opção de redação: O menino estava no prédio que pegou fogo e viu quando o incêndio começou.
d) De quem era a amiga que ia chegar: da Michele ou do Rodrigo?
1a. opção: Michele telefonou para Rodrigo e avisou-lhe que Joana, a amiga dela (ou dele) ia chegar naquela semana.
2. OBSCURIDADE
Obscuridade significa “falta de clareza”. Vários motivos podem determinar a obscuridade de um texto: períodos muito longos, uso de linguagem muito requintada, uso incorreto da pontuação, inversão inadequada dos termos da oração. Exemplo:
“Encontrar a mesma idéia vertida em expressões antigas mais claras, expressiva e elegantemente tem-me acontecido inúmeras vezes na minha prática longa, aturada e contínua do escrever depois de considerar necessária e insuprível uma locução nova por muito tempo.”
Você entendeu o que está escrito? O texto está incompreensível. O parágrafo é longo: algumas palavras são inadequadas (idéias vertidas?), rebuscadas e a inversão de expressões evidencia a obscuridade. O trecho fica mais compreensível assim:
“Depois de analisar e considerar insubstituível uma locução nova, tem-me acontecido encontrar a mesma idéia, com mais clareza e elegância, em uma outra expressão mais antiga.”
Exercício.
Reescreva os períodos abaixo, de modo que fiquem mais claros.
a) Chegamos quando ainda era cedo e pusemos o que tinha sido encomendado no lugar que o administrador havia indicado que era para colocar.
b) Espero que você envie, tendo a máxima urgência, o currículo que foi solicitado por aqueles que organizam o concurso que vai selecionar recepcionistas.
c) Os atletas que acabaram vencendo as Olimpíadas receberam taças que foram confeccionadas especialmente para dar de prêmio naquela situação.
GABARITO:
a) Chegamos cedo e pusemos a encomenda onde o administrador indicou.
b) Espero que você envie com urgência o currículo solicitado pelos organizadores do concurso para recepcionistas.
c) Os atletas vencedores das Olimpíadas receberam taças especiais como prêmio.
3. CACOFONIA
A cacofonia consiste no encontro de sons obtidos pela união de silabas finais e iniciais de palavras, produzindo uma palavra obscena ou desagradável.
Ex.: Se lhe amas, deves dizê-lo. ( lhe + amas = lhamas )
Nunca gaste dinheiro com bobagens. ( Ca + gaste = cagaste )
Estas idéias, como as concebo, são irrealizáveis. (como + as = como-as)
Ovo e uva boa! ( Ô viúva boa! )
4. ECO
Consiste na repetição do mesmo som em palavras muito próximas umas das outras.
Exemplo: A decisão da eleição não causou comoção na população. O aluno repetente mente alegremente.
5. PROLIXIDADE
A prolixidade consiste na utilização de palavras, além do necessário, para expressar uma idéia. Ser prolixo é ficar “enrolando”, “enchendo lingüiça”, não ir direto ao assunto.
Exemplo.:
A árvore, oca por dentro, era muito elevada, tinha vinte metros de altura total, do chão ao topo: estava, por esta razão, prestes a cair, daí a instantes, para baixo.
O exemplo apresenta algumas expressões que são perfeitamente desnecessárias e algumas são até redundantes (já vimos isso no módulo 4 deste Curso). A melhor redação da frase seria assim:
A árvore, oca, tinha vinte metros de altura e estava prestes a cair.
Vamos agora, exercitar.
O trecho abaixo possui vários defeitos, dentre os que você estudou neste Roteiro. Remova esses defeitos, dando nova redação a ele, sem contudo alterar a idéia contida.
Porque o conhecimento por si só há de ser, conforme a opinião de grande número de pedagogos cujas idéias não coincidem com as minhas, considerado como a meta fundamental e essencial da educação, se a experiência que poderíamos chamar de imediata já demonstrou que tem a mesma importância que o já mencionado conhecimento por si só, como base para que se adquira uma formação correta? Na minha opinião, assim como na opinião de todos os que acompanham as minhas idéias, o ensino teórico é superestimado. Do que acabo de dizer é fácil concluir que eu acho que o livro e a prancheta não podem substituir a valiosa e insubstituível experiência do estudante dentro de uma oficina, ou a presença do estudante num canteiro de obras. Por isso é preciso que a experiência esteja desde o início da formação acadêmica unida a ela, e não seja meramente acrescentada à mesma somente após o término do curso, depois que o jovem estudante já concluiu a sua formação profissional.
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Gabarito.
A idéia central do texto é: O conhecimento téorico e a experiência profissional. A nova redação deve exprimir esta idéia, de maneira clara. Para sua orientação damos, abaixo, uma sugestão de redação, indicando os trechos (em vermelho ou itálico) que devem ser retirados ou substituídos, de modo que fique clara e objetiva.
Porque o conhecimento por si só há de ser, conforme a opinião de grande número de pedagogos cujas idéias não coincidem com as minhas, considerado como a meta fundamental e essencial da educação, se a experiência que poderíamos chamar de imediata já demonstrou que tem a mesma importância que o já mencionado conhecimento por si só, como base para que se adquira uma formação correta? Na minha opinião, assim como na opinião de todos os que acompanham as minhas idéias, o ensino teórico é superestimado. Do que acabo de dizer é fácil concluir que eu acho que o livro e a prancheta não podem substituir a valiosa e insubstituível experiência do estudante dentro de uma oficina, ou a presença do estudante num canteiro de obras. Por isso é preciso que (a experiência) o treinamento esteja presente desde o início da formação acadêmica unida a ela, e não seja meramente acrescentad(a)o à mesma somente após o término do curso, depois que o jovem estudante já concluiu a sua formação profissional.
Muito bom resumo! Apresenta organização e clareza e pode ser aproveitado por estudantes de quaisquer níveis. Se os autores não se opuserem, pretendo usar parte desse texto em minhas aulas. Sem mais!
Parabéns! Adorei a aula. Muito interessante a forma que abordou o texto O gigolô das palavras.