TEXTO PARA INTERPRETAÇÃO 4 – NÍVEL: Ensino Médio
A paixão é definida como um sentimento ou emoção levados a um alto grau de intensidade, sobrepondo-se à lucidez e à razão. A paixão se distingue de outros sentimentos por sua força, sua intensidade e sua exclusividade.
Em seu sentido original, a paixão (do latim passionis) é um sofrimento da alma. Os filósofos do século XVII insistiam no caráter passivo dos seres apaixonados, cujos sentimentos dominavam a própria vida. Nos séculos XVIII e XIX, com o Romantismo, a paixão, ainda que ela faça sofrer, é também uma fonte viva de emoções e criatividade. É o que Moacyr Sclair tenta demonstrar, no texto abaixo.
CARTAS DE AMOR
Eu era aluno do Júlio de Castilhos e estudava à tarde (as manhãs, naquela época, estavam reservadas às turmas femininas). Um dia cheguei para a aula, coloquei meus livros na carteira e ali estava, bem no fundo, um papel cuidadosamente dobrado. Era uma carta; dirigida não a mim, mas “ao colega da tarde”. E era uma carta de amor. De amor não; de paixão. Paixão fogosa, incontida, transbordante, a carta de uma alma sequiosa de afeto. À qual o jovem escritor não teve a menor dificuldade de responder.
Iniciou-se assim uma correspondência que se prolongou pelo ano letivo, não se interrompendo nem com as provas, nem com as férias de julho. À medida que o ano ia chegando ao fim, os arroubos epistolares iam crescendo. Cheguei à conclusão de que precisava conhecer a minha misteriosa correspondente, aquela bela da manhã que me encantava com suas frases.
Mas… Será realmente bela? A julgar pela letra, sim; eu até a imaginava como uma moça esguia, morena, de belos olhos verdes. Contudo, nem mesmo os grandes especialistas em grafologia estão imunes ao erro, e um engano poderia ser trágico. Além disto, eu já tinha uma namorada que não escrevia, mas era igualmente fogosa.
Optei, portanto, pelo mistério, pelo “nunca te vi, sempre te amei”. A minha história de amor continuou somente na fantasia. Que é o melhor lugar para as grandes histórias de amor.
( SCLAIR, Moacyr. “Cartas de Amor” in: Minha Mãe não Entende Nada. 2a. Edição. Porto Alegre, L&PM, 1996)
Vocabulário:
Fogoso – ardente, caloroso
Incontido – que não pode ser contido
Sequiosa – desejosa, ávida
Arroubo – arrebatamento, precipitação
Epistolar – relativo à carta
Encantar – enfeitiçar, seduzir
Esguio – alto e delgado, magro
Grafologia – análise da personalidade de um indivíduo por meio de sua escrita
Imune – isento, livre
Fantasia – imaginação
_____________________________________________________
Responda às questões abaixo, após leitura do texto.
- O texto aponta um modelo de organização escolar do início do século XX, no Brasil. Qual é?
- Deduz-se que o modelo de organização escolar tinha por objetivo:
a. ( ) impedir a comunicação entre os alunos de sexo oposto
b. ( ) que os alunos do sexo feminino tivessem a parte da manhã para estudar, porque à tarde era muito quente
c. ( ) evitar namoros dentro do ambiente escolar e suas consequências.
3. O autor do texto encontrou uma carta endereçada a quem e qual era o assunto?
4. Que sentimento, manifestado na carta, faziam com que ela não fosse uma simples carta de amor?
5. O autor passou a manter uma correspondência com sua colega por quanto tempo?
6. A certa altura do texto, o autor informa que desejava conhecer sua colega da manhã, mas desistiu. Por quê?
7. O narrador afirma que a fantasia é o melhor lugar para as grandes histórias de amor. Por quê?
8. No período abaixo, destaque o verbo e a locução adverbial que indicam a distância temporal do narrador ao fato narrado:
“Eu era aluno do Júlio de Castilho e estudava à tarde (as manhãs, naquela época, estavam reservadas às turmas femininas).”
9. Após encontrar os termos acima solicitados, informe:
. pessoa, número, tempo e modo do verbo:
. classificação da locução adverbial:
______________________________________________________
GABARITO
- Separação das turmas dos alunos por sexo e por turno matutino e vespertino.
- Alternativa c
- A carta era endereçada “ao colega da tarde” e o assunto era amor, paixão.
- Paixão fogosa, incontida, transbordante.
- Um ano letivo.
- Ele quiz manter a imagem que ele mesmo construiu (bela, esguia, morena de olhos verdes) através da letra e das frases que sua correspondente escrevia. Se ele a conhecesse, a realidade poderia não corresponder à sua fantasia. Além disso, ele já tinha uma namorada.
- Porque, segundo o autor, as grandes histórias de amor só existem na fantasia, que envolve a imaginação, a situação irreal, construída a partir do desejo daquilo que gostaríamos de ser ou ter e não da realidade. No caso, o autor cita o título de um filme: “Nunca te vi, sempre te amei”, que conta a história de um homem e uma mulher que se corresponderam por muito tempo sem nunca terem se visto.
- Verbo = era locução adverbial = naquela época
- Era – 1a. pessoa do singular do pretérito mais-que-perfeito do indicativo do verbo ser
Naquela época – locução adverbial de tempo
Texto agradável…