Skip to main content
Ensino FundamentalTEXTOS PARA INTERPRETAÇÃO

TEXTO PARA INTERPRETAÇÃO 53 – CONVERSA DE COMPRA DE PASSARINHO (Nível Fundamental)

By 4 May 2013No Comments

TEXTO PARA INTERPRETAÇÃO 53 – CONVERSA DE COMPRA DE PASSARINHO (Nível Fundamental)

CONVERSA DE COMPRA DE PASSARINHO

          Entro na venda para comprar uns anzóis e o velho está me atendendo quando chega um menino da roça, com um burro e dois balaios de lenha. Fica ali, parado, esperando. O velho parece que não o vê, mas afinal olha as achas com desprezo e pergunta: “Quanto?” O menino hesita, coçando o calcanhar de um pé com o dedo de outro. “Quarenta”. O homem da venda não responde, vira a cara. Aperta mais os olhos miúdos para separar os anzóis pequenos que eu pedi. Eu me interesso pelo coleiro do brejo que está cantando. O velho:

          – Esse coleiro é especial. Eu tinha aqui um gaturamo que era uma beleza, mas morreu ontem; é um bicho que morre à toa.

         Um pescador de bigodes brancos chega-se ao balcão, murmura alguma coisa: o velho lhe serve cachaça, recebe, dá troco, volta-se para mim: “- O senhor quer chumbo também?” Compro uma chumbada, alguns metros de linha. Subitamente ele se dirige ao menino da lenha:

          – Quer vinte e cinco? Pode botar lá dentro.

          O menino abaixa a cabeça, calado. Pergunto:

          – Quanto é o coleiro?

          – Ah, esse não tenho para venda, não…

          Sei que o velho esta mentindo; ele seria incapaz de ter um coleiro se não fosse para venda; miserável como é, não iria gastar alpiste e farelo em troca de cantorias. Eu me desinteresso. Peço uma cachaça. Puxo o dinheiro para pagar minhas compras. O menino murmura: “- O senhor dá trinta…?” O velho cala-se, minha nota na mão.

          – Quanto é que o senhor dá pelo coleiro?

          Fico calado algum tempo. Ele insiste: “- O senhor diga…” Viro a cachaça, fico apreciando o coleiro.

          – Se não quer vinte e cinco vá embora, menino.

          Sem responder, o menino cede. Carrega as achas de lenha para os fundos, recebe o dinheiro, monta no burro, vai-se. Foi no mato cortar pau, rachou cem achas, carregou o burro, trotou léguas até chegar aqui, levou 25 cruzeiros. Tenho vontade de vingá-lo:

          – Passarinho dá muito trabalho…

          O velho atende outro freguês, lentamente.

          – O senhor querendo dar quinhentos cruzeiros, é seu.

          Por trás dele o pescador de bigodes brancos me fez sinal para não comprar. Finjo espanto: “- Quinhentos cruzeiros?”

          – Ainda a semana passada eu rejeitei seiscentos por ele. Esse coleiro é muito especial.

        Completamente escravo do homem, o coleirinho põe-se a cantar, mostrando sua especialidade. Faço uma pergunta sorna: “- Foi o senhor quem pegou ele?” O homem responde: “- Não tenho tempo para pegar passarinho.”

          Sei disso. Foi um menino descalço, como aquele da lenha. Quanto terá recebido esse menino desconhecido, por aquele coleiro especial?

          – No Rio eu compro um papa-capim mais barato…

          – Mas isso não é papa-capim. Se o senhor conhece passarinho, o senhor está vendo que coleiro é esse.

          – Mas quinhentos cruzeiros?

          – Quanto é que o senhor oferece?

          Acendo um cigarro. Peço mais uma cachacinha. Deixo que ele atenda um freguês que compra bananas. Fico mexendo com o pedaço de chumbo. Afinal digo com voz fria, seca: “- Dou duzentos pelo coleiro, cinquenta pela gaiola.”

          O velho faz um ar de absoluto desprezo. Peço meu troco, ele me dá. Quando vê que vou saindo mesmo, tem um gesto de desprendimento: “Por trezentos cruzeiros o senhor leva tudo.”

          Ponho minhas coisas no bolso. Pergunto onde é que fica a casa de Simeão pescador, um zarolho. Converso um pouco com o pescador de bigodes brancos, me despeço.

          – O senhor não leva o coleiro?

          Seria inútil explicar-lhe que um coleiro do brejo não tem preço. Que o coleiro do brejo é, ou devia ser, um pequeno animal sagrado e livre, como aquele menino da lenha, como aquele burrinho magro e triste do menino. Que daqui a uns anos quando ele, o velho, estiver rachando lenha no inferno, o burrinho, menino e o coleiro vão entrar no Céu – trotando, assobiando e cantando de pura alegria.

(RUBEM BRAGA. Quadrante. Rio, Editora do Autor, 1962)

Após a leitura do texto, responda às questões abaixo:

1. Achas de lenha são _________________________________________

2. Quais os significados da palavra achas nas frases abaixo:

a) Achas interessante essa crônica? ______________________________

b) Procuras o troco nos bolsos e não achas nada. ____________________

3. Transcreva do texto a frase que equivale a:

a) Calado, o menino concorda. ____________________________________

b) O menino titubeia. ___________________________________________

4. Relacione as palavras aos seus significados, de acordo com o texto:

a. roça                             (   ) caolho

b. desprezo                     (   ) altruísmo; ação em que não se visa ao interesse próprio

c. miúdos                        (   ) sem maiores objetivos; indolente; preguiçosa

d. brejo                            (   ) terreno de lavoura; campo em oposição à cidade

e. sorna                           (   ) desdém

f. desprendimento        (   ) pequeno; espremido

g. zarolho                       (   ) banhado

 

5. Onde acontece o fato narrado no texto?

6. A atitude inicial do velho, dono da venda, para com o menino é:

a. (   ) atenciosa       b. (   ) simpática        c. (   ) de desprezo

7. Essa atitude era intencional?

a. (   ) Sim, porque desse modo, ele desvalorizava a mercadoria do menino, comprando-a por menor preço.

b. (   ) Não. O velho negocinate era mesmo seco e de pouca conversa.

8. Ao perceber o interesse do narrador do texto, o velho demonstrou:

a. (   ) satisfação, pois também ele gostava de pássaros.

b. (   ) aparente desinteresse pelo negócio.

9. Pelas compras feitas pelo narrador, deduzimos que o mesmo iria ______

10. O que disse o velho negociante, quando o narrador perguntou pelo preço do coleiro?

11. A resposta dada pelo negociante a respeito da venda do coleiro é verdadeira? (   ) sim        (   ) não

Justifique sua resposta indicando passagens do texto.

12. A negociação empregada pelo velho, durante a compra da lenha, lhe parece justa e honesta?

a. (   ) Não. Ele estava explorando o menino, na certeza de que este não voltaria com a carga, já que tivera muito trabalho para cortar e trazer a lenha.

b. (   ) Sim, pois, como comerciante que era, procurava um modo de adquirir a mercadoria por menor preço e, assim, auferir maior lucro.

13. Quem o narrador julga que tivesse caçado o coleiro do brejo? Justifique com uma passagem do texto.

14. O narrador também usa da mesma técnica de negociação empregada pelo velho, para a compra do passarinho, isto é, desvalorizar a mercadoria com argumentos, demonstrar desinteresse com atitudes. Identifique sete trechos da narrativa que demonstram essa técnica de negociação usada pelo narrador.

15. Após tanta negociação, qual o abatimento que o narrador conseguiu quando desistiu da compra do passarinho?

16. Para onde se dirigiu o narrador com o material de pesca que adquiriu na venda?

17. Por que o narrador não compra, afinal, o coleiro?

18. Qual teria sido, na sua opinião, a atitude mais justa a ser tomada pelo narrador em relação ao coleiro? Justifique sua resposta.

19. Expresse, em poucas linhas, a mensagem que o texto sugere.

 ______________________________________________________________________

GABARITO

Questão 1. São pedaços de madeira seca para fazer fogo.

Questão 2. a) julgar ou considerar interessante          b) não encontrar

Questão 3.

a)      “Sem responder, o menino cede.” (parágrafo 12).

b)      “O menino hesita.” (parágrafo 1)

Questão 4.

a. roça                     ( g ) caolho

b. desprezo             (  f ) altruísmo; ação em que não se visa ao interesse próprio.

c. miúdos                ( e ) sem maiores objetivos; indolente; preguiçosa

d. brejo                   ( a ) terreno de lavoura; campo em oposição à cidade

e. sorna                  ( b ) desdém

f. desprendimento  ( c ) pequenos; espremidos

g. zarolho               ( d ) banhado

 

Questão 5. Numa casa de comércio.

Questão 6.  Alternativa c

Questão 7. Alternativa a.

Questão 8. Alternativa b.

Questão 9. Pescar.

Questão 10. Disse que o coleiro não estava à venda.

Questão 11. Não. Trechos que comprovam a resposta:

  • “Sei que o velho está mentindo; ele seria incapaz de ter um coleiro se não fosse para venda; miserável como é, não iria gastar alpiste e farelo em troca de cantorias.”
  • “O senhor querendo dar quinhentos cruzeiros, é seu”.
  • “Por trezentos cruzeiros o senhor leva tudo.”
  • “O senhor não leva o coleiro?”

Questão 12. Alternativa a.

Questão 13. Um menino pobre, morador da zona rural. Trecho que comprova a resposta:

  • “Sei disso. Foi um menino descalço, como aquele da lenha.”

Questão 14.

  1. “Eu me dessinteresso. Peço uma cachaça. Puxo o dinheiro para pagar minhas compras.
  2. “Fico calado algum tempo. Viro a cachaça.”
  3. “Passarinho dá muito trabalho.”
  4. “Finjo espanto. Quinhentos cruzeiros?”
  5. “No Rio compro um papa-capim mais barato.”
  6. “Acendo um cigarro. Peço mais uma cachacinha.”
  7. “Afinal, digo com voz fria, seca: Dou duzentos pelo coleiro, cinquenta pela gaiola.”

Questão 15. Duzentos cruzeiros.

Questão 16. À casa de Simeão, um pescador zarolho.

Questão 17. Porque, na sua opinião, um coleiro do brejo não tem preço, por ser um pequeno animal sagrado e livre, como o menino da lenha e seu burrinho.

Questão 18. Deveria tê-lo comprado e depois dar-lhe a liberdade, isto é soltá-lo na mata que é onde devem viver os animais silvestres.

Questão 19. Resposta pessoal.