TEXTO PARA INTERPRETAÇÃO 66 – CONTO GRAFOLÓGICO (Nível Médio)
CONTO GRAFOLÓGICO1
É anunciada, a um grande industrial, a visita de uma pobre parenta, a irmã de sua mãe. Recebe-a friamente:
– Depressa, tia Delfina, tenho muito que fazer. Que deseja?
Tia Delfina põe-se a chorar. Entrara cheia de temor no suntuoso edifício de seu riquíssimo sobrinho, e as duas horas de espera acabaram por aviltá-la.
– Vamos, não percamos tempo, diz o industrial. Com lágrimas nada se resolve. Se veio pedir dinheiro, previno-a que não lhe darei.
– Não se trata de dinheiro. Trata-se do meu filho.
– Não há lugar para novos empregados.
– Ora, Pedro! Eu soube que na semana passada houve uma vaga na seção de correspondência. Pelo amor de Deus, empregue o meu filho!
– Aqui o grau de parentesco não interessa. Acima de tudo está o interesse da indústria.
– Mas é justamente no interesse da casa que eu lhe peço que empregue o rapaz. Ele é formado em ciências comerciais, fala francês, inglês e alemão, é muito ativo e não tem vícios.
– Está bem. Diga-lhe que me escreva uma carta.
– Já a escreveu. Aqui está.
– Deixe-a comigo. Até logo.
Tia Delfina entrega-lhe a carta e sai quase chorando. O grande industrial é tomado de repentina cólera. Que maçada, que aborrecimento esses parentes, que estão sempre a pedir! E, num ímpeto, pega a carta e, rasgando-a, atira-a para dentro do cesto. Com esse gesto, sua cólera desaparece e considera o fato com mais calma. Se o rapaz possui mesmo tantas qualidades boas, talvez pudesse dar-lhe o emprego almejado. Afinal de contas, tia Delfina é irmã de sua mãe…
Arrependido, torna a pegar a carta rasgada do cesto, recompõe-a e, quase como penitência, escreve-a novamente de seu próprio punho. Depois chama o secretário:
– Envie esta carta para a seção de empregos. O candidato é meu parente, mas não quero preferências. O lugar deve ser dado a quem o merecer.
Duas semanas depois o lugar é ocupado, mas não pelo filho de tia Delfina. Esta pede nova audiência.
– Por que não empregou o meu filho? O lugar foi dado e um jovem rico que não precisa dele. Como farei, agora? A quem devo dirigir-me se você não me quer ajudar?
– Esta bem, tia Delfina. Vá para casa. Examinarei o caso.
Tia Delfina retira-se e o industrial manda chamar o chefe da seção de empregos.
– Que houve no concurso para o emprego? – diz severamente. – Entre os candidatos havia um certo Eugênio Tavares, bom jovem, formado, muito competente. Por que não lhe deram o lugar?
– Verdadeiramente, senhor – diz humildemente o chefe da seção – esse Eugênio Tavares teria sido o melhor de todos. Mas o senhor ordenou que a caligrafia dos candidatos fosse examinada pelo grafólogo para conhecer o caráter, o que foi feito. Porém, esse exame grafológico revelou que quem a escreveu é um sujeito antipático, desonesto, despótico, malvado e vulgar.
FOLCO MASUCCI. O livro que diverte. Editora Leia, São Paulo, 1953.
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Notas explicativas:
Grafológico – palavra relativa à Grafologia, que é a ciência que estuda a maneira como as pessoas escrevem, a fim de desvendar-lhea a personalidade.
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1. Substitua as palavras ou expressões em negrito por sinônimos:
a) A tia entrou cheia de temor no suntuoso prédio.
b) Previno-a de que não lhe darei dinheiro.
c) O industrial é tomado de repentina cólera.
d) As duas horas de espera acabaram por aviltá-la.
2. Que fato desencadeia a narrativa?
3. Tia Delfina inicia a entrevista chorando. Três fatos deram origem a esse pranto. Quais são eles?
4. Que palavras provam que o industrial era um homem insensível?
5. A tia demonstrou ser uma mulher prática e prevenida. Como se nota isto no texto?
6. Por que o industrial rasgou a carta?
7. O industrial arrependeu-se e tomou uma decisão muito importante que culminou em uma informação importante. Qual foi esta decisão e qual a informação importante?
8. Apesar de reescrever a carta, o industrial não estava decidido a empregar o parente. Como se comprova isso?
9. Quais os personagens que atuam no texto?
10. Que frase do texto nos revela a importância social do visitado e a insignificância social da visitante?
11. Qual é a primeira referência à má vontade do industrial?
12. Que frase do texto melhor demonstra que o industrial era impetuoso e colérico?
13. Se tudo estivesse em plena paz entre os personagens, não haveria história. Qual o conflito que encontramos no texto?
Para pensar e analisar com seus colegas:
14. Você acha que a situação relatada pelo autor é uma história real ou foi apenas um pretexto para o escritor falar das características humanas. Que outras histórias você conhece que caracterizam as pessoas em boas ou más?
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Gabarito:
Sugestão de resposta. O importante é que a palavra usada transmita a ideia contida na frase.
a) A tia entrou amedrontada no pomposo prédio.
b) Advirto-a de que não lhe fornecerei dinheiro.
c) O industrial é acometido de súbita raiva.
d) As duas horas de espera acabaram por humilhá-la.
2. A visita de uma senhora pobre a um sobrinho rico.
3. a) entrara cheia de temor no edifício;
b) esperara durante duas horas;
c) sentiu-se humilhada com a forma como foi recebida pelo sobrinho.
4. “Vamos, não percamos tempo (…) Com lágrimas nada se resolve.”
5. Quando o sobrinho pediu uma carta de solicitação de emprego, ela já a tinha em mãos.
6. Porque foi tomado de repentina cólera.
7. O industrial reescreveu a carta. Com tal gesto, submeteu sua letra à análise grafológica que revelou o seu próprio caráter: antipático, desonesto, despótico, malvado e vulgar.
8. Pediu ao secretário que levasse a carta ao setor de empregos, mas recomendou que não queria preferências.
9. O industrial, sua tia Delfina e o chefe da seção de empregos.
10. “É anunciada, a um grande industrial, a visita de uma pobre parenta, a irmã de sua mãe.”
11. “Recebe-a friamente.”
12. “E, num ímpeto, pega a carta e, rasgando-a, atira-a para dentro do cesto.”
13. Uma senhora pobre deseja conseguir um emprego para o filho e o parente, que pode fazê-lo, não deseja empregá-lo.
14. Resposta pessoal.